DANOS MORAIS NO CANCELAMENTO DE BILHETE AÉREO DE VOLTA EM CASO DE NO SHOW
DANOS MORAIS NO CANCELAMENTO DE BILHETE AÉREA DE VOLTA EM CASO DE NO SHOW
É usual que consumidores adquiram passagens aéreas de ida e volta no mesmo ato de compra.
Imprevistos em viagens aéreas não são raros, mas o cancelamento da reserva sem nenhum aviso prévio é uma surpresa muito além do aceitável. E o motivo pode causar revolta no consumidor quando seu bilhete é cancelado porque não compareceu para o trecho de ida.
Um exemplo pode ocorrer quando o consumidor encontra um horário de ida mais conveniente e como a remarcação dos bilhetes anteriores acabaria custando mais, opta por comprar um novo bilhete de ida e retornar usando o trecho adquirido anteriormente.
Embora os bilhetes comprados inicialmente tivessem sido pagos, a companhia aérea, em virtude da não apresentação da passageira no voo de ida (no show), cancela automaticamente o bilhete de retorno adquirido na mesma compra. Essa é uma prática comum das empresas no Brasil e em outros países, o que leva o consumidor aos tribunais.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu, em ambas as turmas de direito privado, que essa conduta das companhias aéreas viola pelo menos dois dispositivos, os artigos 39 e 51 do Código de Defesa do Consumidor.
Situação semelhante foi analisada pela Terceira Turma do STJ em setembro de 2018. No caso, a consumidora comprou passagens de ida e volta; por motivos pessoais, não utilizou a ida e, quando tentou retornar, não conseguiu usar o bilhete, tendo de fazer a viagem de ônibus.
Na ação, ela buscou ressarcimento dos gastos e compensação por danos morais, obtendo êxito.
Segundo o relator do recurso no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, a previsão de cancelamento unilateral da passagem de volta, em razão do não comparecimento para embarque no trecho de ida, é rechaçada pelo CDC, cabendo ao Poder Judiciário o restabelecimento do necessário equilíbrio contratual.
“Obrigar o consumidor a adquirir nova passagem aérea para efetuar a viagem no mesmo trecho e hora marcados, a despeito de já ter efetuado o pagamento, configura obrigação abusiva, pois coloca o consumidor em desvantagem exagerada, sendo, ainda, incompatível com a boa-fé objetiva, que deve reger as relações contratuais (CDC, artigo 51, IV). Ademais, a referida prática também configura a chamada ‘venda casada’, pois condiciona o fornecimento do serviço de transporte aéreo do ‘trecho de volta’ à utilização do ‘trecho de ida’ (CDC, artigo 39, I).”
Para o colegiado, o pretexto de maximização do lucro não autoriza as empresas a adotar prática abusiva ou excessivamente onerosa à parte mais vulnerável da relação – o consumidor.
Em outro processo, analisado pela Quarta Turma do STJ em 2017, o colegiado destacou que a prática de condicionar a utilização do bilhete de retorno ao embarque no trecho da ida configura venda casada.
“Ainda que o valor estabelecido no preço da passagem tenha sido efetivamente promocional, a empresa aérea não pode, sob tal fundamento, impor a obrigação de utilização integral do trecho de ida para validar o de volta, pelo simples motivo de que o consumidor paga para ir e para voltar, e, porque pagou por isso, tem o direito de se valer do todo ou de apenas parte do contrato, sem que isso, por si só, possa autorizar o seu cancelamento unilateral pela empresa aérea”, explicou o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso no colegiado.
No momento de perplexidade, o consumidor muitas vezes não sabe direito o que fazer e chega a pensar em parcelar e adquirir o bilhete excessivamente caro oferecido após o cancelamento.
As situações de rescisão unilateral do contrato, segundo o ministro Salomão, podem gerar dano moral a ser indenizado, como no caso da Quarta Turma em que a consumidora também teve que retornar de ônibus ao descobrir que o bilhete de volta havia sido cancelado.
Comportamento abusivo
“A falta de razoabilidade da prática questionada se verifica na sucessão de penalidades para uma mesma falta cometida pelo consumidor. É que o não comparecimento para embarque no primeiro voo acarreta outras penalidades, que não apenas o abusivo cancelamento do voo subsequente”, comentou Salomão, lembrando que o passageiro, ao não se apresentar, já perde a passagem daquele voo ou paga uma multa para remarcá-lo.
As indenizações por danos morais são majoritariamente julgadas procedentes nestas situações tendo em vista a aflição e o transtorno causado ao consumidor.
O trabalho de mover um processo judicial acaba por incentivar as companhias a persistir na prática abusiva, pois entrar na Justiça não é simples para muitos consumidores.
Tempo é dinheiro, e para juntar todos os documentos, comprovar a situação vivida, etc...É preciso muita disposição para se dedicar a isso, o que gera um ônus muito grande para o consumidor.